Lewis Carroll - Parte 2
23 abril 2010
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Sobre a época em que Carroll terminou o primeiro manuscrito da história, alguns aspectos históricos não são bastante claros... Biógrafos afirmam que quando a pequena Alice foi presenteada com o livro, o escritor já andava um pouco afastado dela e de sua família, por conta de uma suposta proposta de casamento à garota.
Se Carroll estava realmente apaixonado por Alice, ou se o evento mencionado acima realmente ocorreu, ninguém poderá dizer com certeza. O que nos parece, sem sombra de dúvida, é que as garotinhas realmente exerciam um estranho fascínio sobre o escritor. Ele possuía um hobby: a fotografia. Dominou tão rapidamente suas técnicas que chegou mesmo a considerar a possibilidade de se tornar profissional.
Cerca de metade do seu acervo fotográfico era composto por imagens de meninas, e em muitos casos, nuas. Sim, isso mesmo. Algumas dessas fotografias foram recuperadas e são facilmente encontradas na internet, mas veja que não há nada explicitamente sexual - ao menos não em um primeiro momento -, e não existem relatos de abusos físicos cometidos pelo escritor.
Apesar de seus biógrafos recentes, como Donald Thomas, afirmarem que Lewis era sim um pedófilo, mesmo que "contido", quando lançamos um olhar à época vemos que a questão das fotografias não era assim tão absurda. Opa, como assim?!
O francês Hugues Le Bailly e a britânica Karoline Leach - ele, acadêmico de estudos culturais ingleses, e ela, dramaturga e estudiosa da obra de Carroll - argumentam sobre um certo "Culto da Criança Vitoriana", espécie de padrão estético que apresentava a beleza infantil e sua nudez como expressões máximas da inocência e pureza. Vários artistas e fotógrafos do período possuiriam imagens de crianças nuas em seus portfólios. Falando de uma maneira simples, era como se as fotografias fofas de bebês pelados que temos hoje se extendessem pela infância. Polêmico, eu sei.
O acervo fotográfico também continha imagens de adultos, e nesse caso, quase sempre constituíam-se de pais ou mães com seus filhos. Fotografias familiares, digamos. Mas a especialista em fotografias Sarah Boxer, escreveu em seu artigo "Girls Loved Him, Pedophile or Not" - As Garotas o Amavam, Pedófilo ou Não -, para o jornal New York Times, que o que podemos compreender das fotografias infantis de Carroll é chocante: as imagens das garotas diferem em muito no tocante à expressão. Enquanto os adultos são sóbrios e posam em posturas bastante comuns, as menininhas aparecem ousadas, desafiadoras, com ares de mistério e até mesmo sedução. E nenhuma parece estar desconcertada, como se Carroll as mantivesse felizes, e bastante à vontade em posar para ele. Alice Liddell é vista em uma dessas fotografias, sua preferida, segundo relatos.
[caption id="attachment_795" align="alignright" width="146" caption="A pequena Alice, clique para ampliar"][/caption]
Carroll nunca foi acusado ou apontado como criminoso sexual, e é sabido que alguns pais aprovavam e muitas vezes levavam as filhas para serem fotografadas ou simplesmente para ouvirem suas histórias fantásticas. No entanto, não deixamos de estranhar o fato de um solteirão que nunca foi visto manifestando interesse por mulheres maduras passasse tanto tempo em companhia de garotinhas com no máximo onze ou doze anos de idade. Ele chegou a publicar o livro "Letters of Lewis Carroll to his Child-Friens" - no Brasil, "Cartas às Suas amiguinhas" -, com as correspondências que trocava com suas "pequenas musas" - incluindo Alice Liddell -, das quais se despedia com "10 milhões de beijos".
O casal de estudiosos mencionado acima, Le Bailley e Leach, afirma no entanto que Carroll pode ter tido um caso com a mãe de Alice, isso explicaria a proximidade com a família,e algumas páginas arrancadas em seu diário, que revelariam os encontros secretos com a Sra. Liddell. Esta teoria não encontra muitos seguidores, e Martin Gardner, na edição comentada de Alice no país das Maravilhas, afirma que a mãe da garota percebia uma certa estranheza em como o escritor se portava junto à sua filha, e tratou primeiro de desencorajar sua atitude, terminando por queimar suas primeiras cartas a Alice.
Na viagem pelo País das Maravilhas, Alice conhece seres fantásticos, como uma lagarta que fuma narguilé, o gato que desaparece e o exército de cartas de baralho da Rainha de Copas. Também participa do chá com o Chapeleiro, anda por um jardim de rosas que cantam e aumenta e diminui de tamanho à medida em que prova bolos, cogumelos e poções. Psicodelia pura. Esse estranho universo é caótico e ausente de valores ou lições explícitas para as crianças, totalmente na contramão das histórias e ficções do período vitoriano na Inglaterra.
Ilustrações da primeira edição lançada oficialmente e seu desenhista, Sir John Tenniel (clique para ampliar)
Alguns atribuem essas criações fantásticas de Carroll ao uso de entorpecentes, e afirmam que ele fazia uso de um fungo recomendado para tratamento médico, o qual se utilizado em grandes quantidades poderia provocar experiências alucinógenas. No entanto, não existem evidências seguras de que o autor consumisse essa substância, sendo reconhecido apenas seu uso constante de maconha. Lewis era usuário ativo da erva, o que não é surpresa num tempo em que escritores, poetas e artistas em geral se inspiravam com absinto e cocaína. No entanto, algumas de suas "viagens" podem ter sido inspiradas não só pela cannabis, mas pelas intensas crises de enxaqueca que o afligiam. É sabido que em crises fortes o indivíduo pode sofrer de alucinações visuais, olfativas e auditivas, e apresentar confusão nos sentidos. Carroll registrou em seu diário, em 1885, "Havia experimentado, pela segunda vez, aquela estranha afecção óptica de ver fortificações que se movem, seguida de dor de cabeça".
[caption id="attachment_798" align="alignleft" width="95" caption="Capa do segundo livro"][/caption]
Após o sucesso do primeiro livro, Lewis lançou, seis anos depois, sua continuação: Through the Looking Glass, and What Alice Found There, em português Alice Através do Espelho e o que Ela Encontrou por Lá. Este, um pouco mais sombrio por conta da morte de seu pai, em 1868.
O escritor continuou seu trabalho na universidade durante a velhice, e permaneceu lá até sua morte por pneumonia em 1865. Lewis Carroll deixou como legado um universo fantástico e infinitamente complexo, analisado e teorizado desde então. Mas não menos complexa foi sua vida pessoal.
Referências:
Uma Patografia de Lewis Carroll, autor de Alice no País das Maravilhas
Biografia de Lewis Carroll
Idéias - Mãe Queimou Cartas de Lewis Carroll
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